15/01/13

No jornal i - "Faz-se Assim"

("Faz-se Assim" no Jornal i de 12/01/2013) - Tem algum método de escrita, rotina ou truques? Como tenho quatro filhos e um início de manhã atribulado, procuro a serenidade necessária para escrever numa pequena corrida pela praia. Não sei se a libertação de endorfinas pode ser considerada um truque, mas para mim é fundamental. Fora essa, existe método e rotina. Bastante. É a única forma de chegar ao fim. - Faz muitas pausas? As normais de um dia de trabalho: pausa para o almoço (e telefonemas necessários), para a família (com jantar incluído), para dormir. Se tudo correr bem, são apenas estas. Quase nunca corre assim tão bem… - Espera pela inspiração? A partir do momento em que a escrita se tornou na minha profissão deixei de poder esperar por ela. Tive de lhe dar horários, prazos. - Escreve a computador ou à mão? Ando sempre com um caderninho de notas e também escrevo ideias no telemóvel. Mas quando parto para a escrita já o faço no computador. - Usa um tipo de letra específico? Escolho uma letra legível, tamanho 12, espaço e meio, justificado... O banal. - Tem manias como acabar sempre uma página, por exemplo? Tento apenas que a última frase do dia me deixe vontade de continuar a escrever no dia seguinte. - Pensa logo no título ou surge depois? Já me aconteceu surgir logo, surgir a meio e surgir no final. Já partiu de mim e já partiu de alguém que leu o que escrevi. Não prefiro nenhuma das formas, desde que se encontre de facto um título que seja um bom rosto para o livro. - Faz algum esboço das personagens e trama? (seja em papel, seja mental) Se não faz, como se processa a construção do livro? Faço um esqueleto do livro. A minha história ganha, desde logo, um princípio, um meio e um fim a que me proponho, à partida. O que não quer dizer que não possa tomar outros rumos. - A primeira frase mantém-se ou muda depois? Geralmente mantém-se. Só depois de ter uma primeira frase é que consigo partir para a escrita do livro. - Evita ler livros quando escreve? Não evito. Eu gosto sempre de ler. O que acontece é que, quando estou envolvida na minha história, qualquer frase que eu leia noutro livro pode dar-me ideias para o meu. Não é que vá escrever nada parecido. Mas só o facto de estar tranquila e predisposta a receber em mim uma história já faz com que novas ideias. - Ouve música enquanto escreve, ou prefere silêncio? Prefiro a música. Ajuda-me a criar o ambiente, faz-me entrar na história e na pele das personagens. Põe-me “lá”. Antes de começar a escrever um livro, procuro o tema ou temas que me levem a sentir o que preciso: é a “banda sonora” desse livro. Pode ser jazz, opera, chill out, fado… Depois oiço esse tema obsessivamente até terminar o livro. - Qual é a sensação que fica, quando termina um livro? É semelhante a terminar uma maratona. Quando partimos estamos cheios de garra, com vontade de vencer. Depois temos momentos de desgaste, momentos em que nos perguntamos o que nos passou pela cabeça para fazer aquilo, qual o objectivo, questionamos tudo, apetece-nos desistir… Até que começamos a ver a meta, ao fundo (para mim a partir das 120-150 páginas). Entusiasmo-nos novamente e recuperamos forças. E é indescritível a sensação de chegar ao fim. Estamos exaustos, mas simultanemente com um sentimento de missão cumprida. Se vamos voltar a correr outra maratona daquelas, não sabemos. Mas pelo menos aquela já terminámos e, independentemente do lugar em que ficámos (o feedback que teremos), soube-nos bem. - Trabalha em mais do que um livro ao mesmo tempo? Geralmente sim. E por isso mesmo a música se torna fundamental. Trocar o CD é trocar de histórias e de estilos. - Escreve em casa? Sim. Por vezes pego no computador e vou escrever para outros locais, seja para sentir determinados ambientes, seja porque estou farta de estar em casa. - O que é que não pode faltar na sua mesa de trabalho? Papéis, CDs, livros, caos. Gosto de uma boa secretária desarrumada. Se estiver arrumada é sinal de que preferi arrumá-la a escrever. - Em que é que está a trabalhar neste momento? Tenho alguns projectos a decorrer, no "Livro da Minha Vida", trabalhos diversos para editoras... Mas estou sobretudo envolvida na escrita de um novo romance histórico, que gostava de lançar no próximo ano. - Já deitou fora muita coisa que tenha escrito? Não gosto de deitar nada fora. Tenho guardados até os meus escritos da adolescência. Se um dia os meus filhos quiserem saber quem fui, terão que me ler. - Como é que dá o nome às suas personagens? Depende do livro. Nos romances históricos estou balizada pelas personagens reais e pelos nomes próprios da época. Nos livros infantis ou nos romances intemporais há outra liberdade. Já baptizei personagens com nomes de pessoas que conheço. Como também já escrevi um romance inteiro (o “Frio”) sem dizer o nome das personagens, para que elas pudessem ser qualquer pessoa.

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